Mês: agosto 2023

olho pra cima e fico tonto

Belo Horizonte, 27 de agosto de 2023

15° 23°

27 de agosto é dia do Psicólogo. Em 1883 explodia o vulcão Krakatoa, num evento que foi sentido no mundo todo e causou uma devastação difícil até de ser imaginada, destruindo completamente a Ilha de mesmo nome e matando um sem número de pessoas. O fenômeno alterou o clima do planeta, mexeu com o reflexo da luz solar, com o ar e até com as cores do pôr do sol em vários lugares. Essa explosão produziu o som mais alto conhecido no planeta Terra. Também é o dia em que, em 1825,  a Independência do Uruguai foi reconhecida, esse país tão pequeno e que parece tão encantador. É o Dia de Nossa Senhora dos Prazeres e de Santa Mônica. Em 1970 Jimi Hendrix cria sua última gravação em estúdio no Electric Lady Studios em Nova York, um instrumental chamado “Slow Blues”. Em 1976, Renée Richards, a primeira atleta transexual do tênis foi impedida de competir no torneio US Tennis Open. Em 2008  Barack Obama se torna o primeiro afro-americano a ser nomeado por um grande partido político para Presidente dos Estados Unidos. Em 1964 estreia Deserto Vermelho, de Antonioni, e em 2013, no Festival de Veneza, estreava Gravidade de Alfonso Cuarón. Em 1576 morreu Ticiano. E na véspera, em 1914, nasceu Julio Cortázar.

Logo vai terminar o prazo
para o homem construir sua fachada.
Ele continua em andaimes.
Provisório.
Exibe máscaras cambiantes.
Sua face inconclusa,
sustentada por ferragens,
parece esconder que,
em todos esses anos de obra,
ergueram-se inúteis plataformas
para edificar um escombro.

Donizete Galvão


Em 27 de agosto de 1941, Cesare Pavese escreveu em seu diário:

A grande tarefa da vida é justificarmo-nos. Justificarmo-nos é celebrar um rito. Sempre.

Noutro 27 de agosto, em 1950, o mesmo Cesare Pavese deixava a última nota do seu diário na forma de um bilhete de despedida suicida que dizia o seguinte:

“Perdoo a todos e a todos peço perdão. Tudo bem? Não façam estardalhaço”

Cesare Pavese – Ofício de Viver – Ed. Relógio D’água


A Construção de Um Oráculo

A carta 3 de ouros é muito positiva e representa a capacidade de construir algo duradouro e significativo na vida, que todos temos, mesmo que não usemos muito. Essa carta simboliza o trabalho em equipe, a cooperação, o planejamento e a realização de projetos. Ela indica que você consegue seguir no caminho certo e que pode contar com o apoio de outras pessoas próximas.
A carta 3 de ouros também sugere que você pode usar seus talentos e habilidades de forma produtiva e criativa, e pode se dedicar a aprimorar suas competências.
Nesta semana, o 3 de ouros nos incentiva a construir. Construir algo do início ao fim. Ela nos incita também a olhar para o que já construímos e queremos construir na vida, desde um barquinho de papel para uma criança até um projeto muito mais elaborado e demorado. Esta carta chega pedindo para que façamos algo concreto. Nem é preciso usar a criatividade, se ela não vier. Basta pensar em algo, ir lá e construir, seja um quebra-cabeça, uma receita do caderno da avó ou do Instagram, ou um projeto de doutorado, ou um plano de voo.
Nós somos seres que fazem. Construir é parte do que nos torna humanos e é o que possibilitou a vida em sociedade e a civilização. O 3 de ouros quase diz que construir está inscrito em nosso DNA. A gente constrói tanta coisa e nem se dá conta da importância que isso tem para uma vida plena e significativa.
Pois além de celebrar qualquer conquista que apareça essa semana, de agradecer as pessoas que ajudaram nos seus projetos, construa alguma coisa com as suas mãos e o seu trabalho. Desta vez, com alegria, movido pela alegria, ao invés da raiva. Se você for do rolê, pode ofertar sua produção para alguma divindade, para o cosmos, para o holístico…
A importância de construir algo na vida está relacionada ao sentido de propósito, de contribuição e de legado que você deseja deixar, mesmo que só para você e sua história. Ao construir algo, você expressa essência, paixão e missão, valores, sonhos. Construir algo requer disciplina e paciência. Nem sempre é fácil enfrentar as contrariedades que surgem. Mas a carta 3 de ouros encoraja você a não desistir dos planos e confiar na capacidade de superar os obstáculos, mesmo que seja somente a dúvida sobre a cor do papel em que vai dobrar o seu barquinho. Ela mostra que você não está sozinho nessa jornada e pede para que se lembre das pessoas que te ajudam. O tarólogo Leo Chioda diz a respeito:

TRÊS DE OUROS é ir lá e fazer, mesmo que não se saiba muito. Porque é hora de se mover em relação ao sentido das coisas e da sua própria vida. Entenda o seguinte: enquanto você faz é que o sentido vem. Depois que fez é que sente se vale a pena ou não continuar fazendo. É assim.

Dito isso, e passada a brevíssima e pouco profunda reflexão sobre a importância de construirmos algo, do que significa num sentido comum a construção, podemos dar um passo adiante e lembrar, com Hannah Arendt, dos excessos de uma sociedade altamente focada em construir. É certo que temos nossa porção Homo Faber, somos os seres que fabricam. Mas ao nos centrarmos em construir coisas sem parar, temos que ter em mente que as coisas fabricadas, em primeiro lugar sempre o são às custas da violência, o lápis é o que é à custa da violência com a árvore e assim por diante. E em segundo lugar, tudo que construímos, imediatamente ao fim do processo de fabricação pode virar um meio. Eu faço um cachecol de crochê que é um meio de enfeitar, de minimizar o frio etc. Sim, isso é o que nos faz: ao construir também nos construímos. Mas tenhamos em mente que tudo pode virar meio, se o foco é construir desenfreadamente. Como diz Hannah Arendt:

em um mundo estritamente utilitário todos os fins são constrangidos a serem de curta duração e a transformarem-se em meios para alcançar outros fins.

Este construir, fabricar sem reflexão pode causar, e causou, uma sociedade muito disfuncional, embora altamente “fabricadora”. Inclusive em nossa relação com a natureza somos guiados por essa noção de utilidade, de meio, de fabricação sem fim e podemos tristemente contemplar no que resultou.

Hannah Arendt ainda chama a atenção para algo que a sociedade do Homo Faber não pode ou não quer compreender, que é a diferença entre a utilidade e a significância. É preciso também, atentar para o significado do que construímos, do que fabricamos. Essa pequena digressão é somente para semear uma reflexão que vai muitíssimo mais longe, mas que está ligada ao 3 de Ouros, sobre as consequências do construir.

Vamos construir o que pudermos essa semana, e mais além lembrar do que isso significa socialmente e do que fabricar sem significado traz. E quem sabe no final possamos morrer atrapalhando o trânsito.

Boa semana, operários.

3 de Ouros

O 3 de ouros é uma carta promissora. Ela representa a importância de construir algo sólido e duradouro, em termos materiais ou emocionais. Esse arcano é frequentemente associado ao trabalho em equipe, à colaboração e ao esforço conjunto para alcançar um objetivo. Quando aparece em uma leitura de tarô, está nos lembrando da importância de investir tempo, energia e recursos na construção de algo significativo.

No contexto do trabalho e dos negócios, o 3 de ouros fala sobre a importância de construir uma base sólida. Isso pode significar investir em habilidades e conhecimentos, buscar parcerias estratégicas e construir uma reputação sólida. O sucesso profissional não é conquistado apenas com talento, mas também com dedicação e comprometimento. Além disso, o 3 de ouros mostra a importância de trabalhar em equipe, pois ninguém alcança o sucesso sozinho e é necessário colaborar e compartilhar ideias com outras pessoas. Essa carta nos incentiva a reconhecer e valorizar as habilidades e contribuições dos outros.

No âmbito emocional, a carta de tarô 3 de ouros é sobre a importância de construir relacionamentos significativos. Relacionamentos requerem tempo, esforço e comprometimento para crescer e se desenvolver. Essa carta incentiva o investimento em relacionamentos que sejam construtivos e nutritivos, onde haja espaço para o crescimento mútuo. Além disso, o 3 de ouros também fala de construir uma base sólida dentro de nós mesmos. É importante investir em crescimento pessoal e desenvolvimento espiritual, buscar conhecimento, cultivar habilidades e trabalhar em nosso crescimento interior.

Um texto que construiu a minha alma

Kurt Vonnegut escreveu: “Quando eu tinha 15 anos, passei um mês trabalhando em uma escavação arqueológica. Eu estava conversando com um dos arqueólogos um dia durante nossa pausa para o almoço e ele fez perguntas do tipo ‘para conhecê-lo’ que você faz aos jovens: Você pratica esportes? Qual é a sua matéria favorita? E eu disse a ele, não, eu não pratico nenhum esporte. Eu faço teatro, estou no coral, toco violino e piano, costumava ter aulas de arte.
E ele disse: UAU! Isso é incrível! E eu respondi: “Ah, mas eu não sou bom em nenhuma delas.”
Então ele disse uma coisa que nunca vou esquecer e me surpreendeu muito porque ninguém nunca havia me dito algo assim antes: “Eu não acho que ser bom nas coisas seja o objetivo de fazê-las. Eu acho que se tem experiências maravilhosas com diferentes habilidades, e tudo isso ensina coisas que fazem de você uma pessoa interessante, não importa quão bem você as faça.”
E isso realmente mudou minha vida. Porque eu fui de um fracassado, alguém que não tinha talento suficiente em nada para se destacar, para alguém que fazia as coisas porque gostava delas. Eu fui criado em um ambiente tão voltado para realizações, tão inundado com o mito do talento, que achava que só valia a pena fazer as coisas se fosse possível “ganhar” nelas”.

Este texto é um apócrifo da internet, mais um, e não pude encontrar de onde surgiu originalmente. O único que se consegue confirmar é que Kurt Vonnegut realmente esteve em um acampamento de arqueologia em torno dos 15-16 anos. Mas ainda que anônimo, é um texto que mexeu demais comigo


Arte que sempre, sempre constrói. E que não precisa nunca de utilidade.

Livro

Os Pilares da Terra – Ken Follet – Indico porque é um prazer ler Ken Follet, porque é um livro delicioso de ler, mesmo sendo um calhamaço. É daquelas obras imersivas, em que você mergulha em outro universo e esquece do mundo. É uma literatura de qualidade, a gente torce para o livro não acabar. Ken Follet é um mestre em contar boas histórias. Vale demais a leitura, é daqueles livros para esquecer as mazelas do mundo e da vida.


Os Pilares da Terra (The Pillars of the Earth) é um romance britânico de ficção histórica, escrito por Ken Follett e publicado em 1989. A história se passa na Inglaterra do Século XII, durante um período conhecido como A Anarquia, em que dois possíveis sucessores vão lutar pelo trono inglês. É neste cenário que Tom, um humilde pedreiro e mestre de obras, persegue o seu sonho de erguer uma imponente catedral, na fictícia cidade de Kingsbridge. É uma obra de ficção histórica que narra a construção de uma catedral na Inglaterra medieval. A história se desenrola ao longo de quatro décadas,  e acompanha as vidas de vários personagens que se envolvem em conflitos políticos, religiosos, sociais e pessoais. O autor retrata com riqueza de detalhes a época, os costumes, as técnicas de arquitetura e engenharia, as intrigas e as paixões que movem os protagonistas.


Documentário

Conterrâneos Velhos de Guerra – Vladimir Carvalho – 1990 – O melhor documentário brasileiro de todos os tempos. Tá. Tudo bem, pode não ser o melhor mas está entre os 5 primeiros. Indico pois é um filme fantástico, necessário, que é o retrato do nosso país. O Brasil inteiro está nele, tem toda nossa história, nossos vícios, nossa explicação. É imperdível, indispensável, obrigatório. Façam essa gentileza consigo mesmos e vejam essa obra magistral. Está disponível inteiro no YouTube.


O documentário Conterrâneos Velhos de Guerra, dirigido por Vladimir Carvalho, é uma obra-prima do cinema brasileiro que retrata a história da construção de Brasília sob a perspectiva dos trabalhadores que vieram de diversas regiões do país para erguer a nova capital. O filme, lançado em 1990, aborda os conflitos sociais e políticos que marcaram a ditadura militar no Brasil. O documentário é composto por imagens de arquivo, entrevistas com os protagonistas da época e depoimentos de historiadores, sociólogos e jornalistas que analisam o contexto histórico e as contradições do projeto de Juscelino Kubitschek. A narrativa é conduzida pela voz do próprio diretor, que também participou da construção de Brasília como estudante de arquitetura e militante político. O filme mostra as condições precárias de trabalho e moradia dos operários, que viviam em acampamentos improvisados chamados de “candangos”, e as lutas sindicais e populares que reivindicavam melhores salários e direitos sociais. O documentário também revela as violências cometidas pelo Estado contra os trabalhadores, como as torturas, os desaparecimentos e os assassinatos. O documentário é um registro histórico que denuncia as injustiças e as desigualdades sociais que marcaram a fundação da capital.


Série

1883 – Prelúdio de Yellowstone – Taylor Sheridan – 2021. Indicação da Laís. Eu assisti ao primeiro episódio e fiquei muito impactada, achei muito bem feito, com uma história que promete ser interessantíssima. Laís disse que lembrou desta série pois é sobre a luta de uma família para construir um rancho e uma vida nova. É sobre uma época e um lugar onde construir era o próprio sentido da existência. Eu gostei tanto do primeiro episódio que já quero acabar aqui e ir assistir ao restante. 


A série 1883 é cronologicamente a primeira de várias séries derivadas de Yellowstone. Ela conta como os Duttons, a família protagonista da série Yellowstone, conquistaram a terra que se tornaria o Rancho Yellowstone. Segunda obra produzida na franquia Yellowstone, a série é composta por dez episódios e foi concluída em 27 de fevereiro de 2022. A narrativa segue a geração pós-guerra civil da família Dutton enquanto eles deixam o Tennessee, viajam para Fort Worth, Texas, e se juntam a um vagão de trem empreendendo a árdua jornada para o oeste até Oregon antes de se estabelecerem em Montana para construir o que viria a ser o Rancho Yellowstone.


Filme

Inferno na torre – John Guillermin -1974. Indicação do Akio. Indicado por ser um ótimo filme sobre construir. Um filme sobre mal construir, sobre excessos, sobre limites, ganância, sede de poder e inabilidades. Mostra do que os seres humanos são capazes de fazer quando estão no limite, em situação de catástrofe ou de morte iminente. E também pode servir como alegoria para o que falamos sobre uma sociedade excessivamente “fabricante”, que não sabe impor limites à uma expansão sem fim. 


O filme “Inferno na Torre” é um clássico do cinema de catástrofe, lançado em 1974. Dirigido por John Guillermin, o filme conta a história de um incêndio em um arranha-céu de 138 andares, que coloca em risco a vida de centenas de pessoas. A trama se passa em um edifício comercial de San Francisco, chamado “The Glass Tower”, que é considerado o mais seguro do mundo. Porém, durante a festa de inauguração do prédio, um curto-circuito provoca um incêndio no andar 81, onde está localizado um restaurante. O fogo se espalha rapidamente pelos andares superiores, deixando os convidados da festa presos no terraço. Enquanto isso, o chefe de segurança do prédio, Doug Roberts (interpretado por Paul Newman), tenta coordenar as operações de resgate e evacuação dos demais ocupantes do edifício. A situação se agrava quando um helicóptero tenta resgatar alguns convidados do terraço, mas acaba colidindo com o prédio e provocando uma explosão. A partir daí, a luta pela sobrevivência se intensifica, com muitos personagens enfrentando situações de risco extremo. O filme é baseado no livro “The Tower”, de Richard Martin Stern, e foi inspirado em fatos reais, como o incêndio no Edifício Joelma, em São Paulo, que ocorreu em 1974 e deixou mais de 170 mortos. “Inferno na Torre” foi um grande sucesso de bilheteria e recebeu várias indicações ao Oscar, incluindo nas categorias de Melhor Filme e Melhor Diretor. Apesar de ter sido lançado há mais de quatro décadas, “Inferno na Torre” ainda é lembrado como um dos melhores filmes do gênero de catástrofe. Além disso, a história serviu como alerta para os riscos envolvidos na construção de edifícios cada vez mais altos e complexos.


Creio que quase sempre é preciso um golpe de loucura para se construir um destino.

Marguerite Yourcenar

Post com a colaboração de @akio@laismeralda, que é a melhor cartomante do pedaço, marque sua consulta com ela.


27 de agosto é o 239.º dia do ano no calendário gregoriano (240.º em anos bissextos). Faltam 126 dias para acabar o ano.


Se você leu até aqui, obrigada! Esse é o meu almanaque particular. Um pedaço do meu diário, da minha arca da velha, um registro de pequenas efemérides, de coisas que quero guardar, do tempo, do vento, do céu e do cheiro da chuva. Os Vestígios do Dia, meus dias. Aqui só tem referências, pois é disso que sou feita.

© Nalua – Caderninho pessoal, bauzinho de trapos coloridos, nos morros de Minas Gerais. Inverno, mas um calorão do capeta.

Esta é a 24ª de 78 páginas que terá este almanaque.